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 TEU PULSAR É TAMBÉM O MEU.

 Reflexões sobre a singular pluralidade da (co)existência. 

 (2017 - 2022) 

Aqui, Mariana Fogaça expõe parte de sua mais recente pesquisa intitulada Teu Pulsar é Também o Meu, compartilhando um pouco do conceito investigado, assim como, parte de sua prática artística. Este projeto desenvolveu-se em profundidade ao longo dos anos 2019 e 2020 no âmbito do Mestrado em Artes Plásticas MAP–Intermedia na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, em Portugal. Entretanto, vale destacar que a investigação e produção artística acerca desta pesquisa continuam atualmente.

Aproveita-se para fazer um breve agradecimento à equipe de orientação do MAP, os artistas professores doutores Filipa Cruz e Pedro Tudela

Teu Pulsar é Também o Meu, é um projeto artístico multidisciplinar, desenvolvido no âmbito do Mestrado em Artes Plásticas, que através de cruzamentos entre as Artes Plásticas, a Filosofia, a Antropologia e a Biologia, tem o intuito de refletir sobre a singular pluralidade da (co)existência e, quiçá, semear uma percepção intersubjetiva de compartilhamento do mundo. Por isso, neste projeto Mariana Fogaça investiga a relação entre corpo e mundo, entre unidade e multiplicidade, entre interioridade e exterioridade, a partir de uma perspectiva singular-plural que compreende a existência como coexistência.

Nesse sentido, a artista convida o espectador a perceber-se integral ao mundo e, por isso, capaz de acolher e conceber toda a forma de existência como uma extensão de si. Revogando, assim, as fronteiras entre corpo e mundo, entre humanos e não-humanos, entre “eu” e o “outro”.

Foi a partir da escrita poética que as primeiras reflexões sobre a relação corpo-mundo e sobre a dicotomia criada entre ser-humano e natureza, foram expressas. O homônimo poema autoral Teu Pulsar é Também o Meu, surge em 2017, mas é somente durante sua pesquisa de mestrado, em 2019 e 2020, que este poema é resgatado e este projeto amadurece e se desenvolve.

Em Teu Pulsar é Também o Meu, Mariana almeja, através do uso de diferentes técnicas como a fotografia, a instalação imersiva, a escultura em madeira, a desconstrução do têxtil e a escrita poética ser capaz de semear a concepção de existência como coexistência levando o observador à percepção do "eu" como "nós". 

 Projeção imersiva: Corpos-coexistentes (2019-2020) 

Em Corpos-coexistentes, Mariana Fogaça, propõe criar um ambiente imersivo no qual o espectador possa sentir-se integral ao corpo-floresta diante de si. Para isso, foram projetadas, em uma escala semelhante à realidade, duas imagens-movimento lado a lado, formando quase que uma paisagem panorâmica. Estas imagens-movimento, por sua vez, são compostas por três diferentes fotografias de distintos ângulos deste complexo organismo florestal. Durante a projeção, as fotografias que compõe cada imagem-movimento, permeiam, sutilmente, umas às outras, criando a percepção de estarmos adentrando aquele corpo-floresta, pouco a pouco, no ritmo do seu próprio respirar. Desse modo, a paisagem em Corpos-coexistentes apresenta-se como um corpo-singular-plural com incontáveis camadas a serem percebidas e adentradas. A permeabilidade das camadas sugere, também, o constante movimento e transformação inerente ao contínuo entrelaçamento entre matéria, espaço e tempo. A ausência-presença da figura humana é revelada na imersão do espectador que, assim como, o próprio corpo da artista no momento do registro fotográfico, percebe-se integral a este corpo-floresta. Por fim, a imersão proposta pela projeção faz do espaço que a acolhe extensão e reverberação deste corpo-nós-floresta.

Imergi, por este corpo-floresta, com a câmera nas mãos, por entre árvores, plantas, raízes, folhagens, troncos, musgos, pedras, pássaros, formigas, mosquitos, por todo um universo, que se sobrepunha e se desdobrava, naturalmente, diante de mim. Ao caminhar por este denso entrelaçamento de corpos-singulares, era possível ouvir sons os quais meus olhos já não alcançavam. Esta paisagem apresentava-se como um complexo organismo. Um corpo-único-múltiplo com incontáveis camadas a serem percebidas. Um cosmos: visível e invisível em sua totalidade. Um ser-com em ininterrupta regeneração e contínua coexistência. Quiçá, não somos capazes de compreender sua grandeza. No entanto, imersa naquele universo, era como se eu pudesse senti-lo em mim e percebê-lo para além de sua superfície. Esta entrega despertava, em meu corpo, uma memória-natura talvez já esquecida e que, agora, emergia por entre cachoeiras e fios de cabelo. Meu corpo parecia reconhecer-se naquele ecossistema.

 

Ficha técnica:

Corpos-coexistentes

Projeção imersiva

323 x 970m

2019-2020

 Escultura: Corpo-uma-vez-árvore-agora-paisagem (2019-2020) 

A escultura Corpo-uma-vez-árvore-agora-paisagem debruça-se sobre o ininterrupto ciclo vital e o constante entrelaçamento entre matéria-espaço-tempo. Aqui, a matéria é compreendida inerente à concepção de corpo como singularmente plural, e, por isso, se manifestaria através de múltiplos ciclos que, quando completados, logo recomeçariam em uma constante metamorfose, fazendo com que a ideia de morte e vida partilhem do mesmo ponto de origem. Nesse sentindo, entende-se, também, a noção de tempo como duração, isto é, como um prolongamento de instantes contínuos e indivisíveis e o espaço como multidimensional.

Corpo-uma-vez-árvore-agora-paisagem nasce deste corpo-tronco ainda capaz de abrigar vida, mesmo que não mais a de seu corpo-uma-vez-árvore. Sobre e sob sua casca, cohabitam diferentes seres, entre samambaias, musgos, líquens, centopeias e pequeninas aranhas, vidas acolhidas por este corpo-agora-paisagem. O conceito de paisagem, aqui percebido como um complexo organismo formado por corpos intra-inter-conectados e dependentes, parece revelar-nos a potência deste micro-macro-cosmos “coexistencial” do qual todos nós emergimos e imergimos. 

Por outro lado, podemos considerar a presença deste corpo-escultórico, compreendido como corpo-uma-vez-árvore afastado do seu contexto natural, também, como um convite à indagação sobre a relação opressora e destrutiva que políticas industriais, extrativistas, especistas e antropocêntricas adotam perante o que é considerado como natureza. 

Por fim, Mariana Fogaça costuma dizer que Corpo-uma-vez-árvore-agora-paisagem é uma co-criação entre este corpo-tronco e seu próprio corpo. Ao longo deste processo de co-criação a artista fez inúmeras anotações e relatos que considera relevante compartilhar:

Trabalhar sobre aquele corpo seria uma vivência completamente nova. Um desafio, talvez. Faltava-me técnica, conhecimento e, sinceramente, um pouco de coragem. Acredito, que essa experiência também seria algo novo para aquele corpo que, até então, só havia sabido ser árvore. Já no início do processo, entendi que a minha intervenção sobre aquele corpo-agora-paisagem seria mínima. Apenas a madeira já exposta, já sem casca, seria trabalhada. Respeitei seu caráter efêmero, ao não fixar as partes da casca já soltas e ao manter todo o microcosmos, entre musgos, samambaias e centopeias, ali existente. A madeira ainda verde, repleta de seiva, não é considerada ideal para ser esculpida, pois suas fibras húmidas abrem-se em demasia. No entanto, para mim, fazia todo sentindo que aquele corpo pudesse, de certa forma, responder às minhas ações, como se estivesse a guiar minhas mãos e a dizer-me até onde eu poderia seguir. Nossos corpos-singulares entregues à presença um do outro. Deixei-me ser levada e aos poucos fui ultrapassando parte de sua pele até chegar em sua carne. Veios, nós, tons, texturas, marcas, histórias. O tempo, impresso, emergia a cada camada esculpida. Aquele corpo, agora exposto, parecia compartilhar memórias antes cultivadas. Permitia-se ser tocado, pelo universo, às avessas.

A ruptura daquele corpo-tronco com seu corpo-singular-árvore, tivera sido demasiado brusca, um destino, inesperadamente, antecipado. Por isso, queria-o longe do solo e nas alturas uma última vez. Mas, para suspendê-lo, era preciso uma última intervenção. Confesso, que no dia da perfuração tive receio de que, talvez, estivesse impondo uma vontade que julgava ser mútua. Estava receosa de ferir aquele microcosmos que, por semanas, havia preservado e cuidado. Entretanto, tive a certeza que caso esta não fosse, também, a sua vontade, logo me faria perceber, certo que eu o respeitaria.

Debruçada sobre aquele corpo-uma-vez-árvore-agora-paisagem, percebi, também, o quão desconectados muitos de nós, corpos-humanos-urbanos, estamos da pluralidade e complexidade do corpo-natura. Conhecer àquele corpo-uma-vez-árvore- agora-paisagem foi, também, conhecer-me.

Ficha técnica

Corpo-uma-vez-árvore-agora-paisagem

Escultura em madeira com preservação da vida vegetal e animal (co)existente.

Peça única em constante transformação.

142 x 16 x 17,4 cm

2019-2020

 Estudos sobre a paisagem (2020-2022) 

Nas fotografias abaixo, a artista aborda o conceito de ser-com através da intersecção destes corpos-imagens-coexistentes. Aqui, a ideia de sobreposição é entendida, não como anulação, incorporação ou soma, mas como simultaneidade existencial, ou seja, a partir do entendimento de existência como coexistência. Nesse sentido, Mariana traz a perspectiva do filósofo francês Jean-Luc Nancy, quando propõe a compreensão da primeira pessoa do singular como primeira pessoa do plural, isto é, a percepção do "eu" como "nós". E é sob esta lente que a artista nos convida a contemplar as fotografias expostas. Como um corpo singularmente plural, uma imagem-única-múltipla capaz de revogar a ideia de fronteiras individuais, uma vez que aqui, cada corpo é percebido no e com o outro, como um ser-com-o-outro-no-mundo.

Ficha técnica

Fotografia digital.

Edições limitadas.

2020-2022

 Escultura têxtil: O corpo-fio não faz do traço palavra enunciada (2020) 

 Eu acredito que existam dois tempos distintos e muito importantes para a contemplação da obra O Corpo-fio não faz do traço palavra enunciada, o primeiro é a visualização do processo de criação e o segundo é a relação entre o corpo-escultórico e o espaço durante o momento expositivo. Eu digo isso, porque, a ideia de coexistência, que eu venho abordando de diferentes maneiras ao longo de todo este projeto, é, aqui, concebida como análoga à trama de um tecido. Visto que cada corpo-fio, ao enlaçar-se e reenlaçar-se revela-se indissociável da concepção do corpo-trama. Esta analogia entre tecido e o conceito de coexistência se torna ainda mais evidente durante o processo de desfazer deste corpo-trama em inúmeros corpos-fio-desenlaçados, quando testemunhamos letras, palavras e poema tornarem-se versos abstratos sobre vestígios de tinta. Tais palavras-vestígios parecem, todavia, ecoar por este corpo-não-mais-trama-ainda-trama. No entanto, é certo que o corpo-fio, quando isolado, não faz do traço palavra enunciada.

Quando em exposição, a luz incidente transpassa a porção deste corpo-não-mais-trama sendo capaz de expandi-lo por meio de sombras negras desenhadas no espaço que o acolhe. 

Ficha técnica:

O corpo-fio não faz do traço palavra enunciada

Poesia datilografada sobre linho desconstruído.

Peça única.

15 x 470cm.

2020.

Clique aqui para saber mais sobre os estudos do corpo têxtil.

Exposição Teu Pulsar é Também o Meu. (2020)

 

Apresentação, de parte do projeto, no âmbito do Mestrado em Artes Plásticas realizada no Museu da Faculdade de Belas da Universidade do Porto em outubro de 2020.

Intervenções urbanas

 Escultura Têxtil: Germinar entre batimentos desritmados (2021) 

Na obra Germinar entre batimentos desritmados, a ideia de coexistência, que Mariana Fogaça vem abordando de diferentes maneiras ao longo desta investigação, é, aqui, concebida como análoga à trama de um tecido. Visto que cada corpo-fio, ao enlaçar-se e reenlaçar-se revela-se indissociável da concepção do corpo-trama. Tal analogia torna-se ainda mais evidente no momento em que a artista propõe o desfazer este corpo-trama em inúmeros corpos-fio-desenlaçados. A ação contida na (des)construção do corpo-trama faz com que o enlaçamento entre poesia bordada e tecido seja parcialmente desfeito, uma vez que, a própria ação de destramar, faz com que o íntimo de cada palavra bordada seja atravessado. Os versos, quase abstratos, revelam-se como entranhas e cicatrizes inerentes a este corpo-não-mais-trama-ainda-trama.

 

O verso Germinar Entre Batimentos Desritmados, foi inspirado na perseverança da presença vegetal em ambientes demasiadamente urbanos e construídos. Levando-me a refletir sobre como a espontaneidade no ato de existir torna-se, na verdade, um ato de resistência. E foi a partir desta ideia de resistência que optei, então, por (re)bordar o verso sobre os vestígios daquele corpo-trama. 

Germinar entre Batimentos Desritmados, é a primeira de uma série de intervenções urbanas na qual, a partir de enxertos poéticos ao longo do tecido-urbano-predominantemente-humano, almejo destacar a resiliência da vida vegetal intrínseca ao corpo da cidade, que apesar de frequentemente marginalizada, podada e controlada, é capaz de (re)ocupar espaços através do incansável germinar de sementes e do tropismo persistente de suas raízes. Convocando-nos a questionar nossas estruturas socioambientais e, principalmente, convidando-nos a pensar sob uma nova perspectiva baseada na coexistência entre mundos construídos e naturais. Sugerindo, assim, a (re)ocupação da malha-urbana-uma-vez-natural por uma paisagem híbrida urbana-natural.” 

Ficha técnica:

Germinar entre batimentos desritmados.

Poesia bordada em linha de algodão sobre linho desconstruído.

01/03.

80x90cm.

2021.

Clique aqui para saber mais sobre os estudos do corpo têxtil e aqui para visualizar as intervenções urbanas que Mariana realizou em Portugal e no Brasil. 

Intervenções urbanas

 Enxertos poéticos pelo corpo da cidade (2021) 

Nesta intervenção, Mariana Fogaça, almeja, a partir de enxertos poéticos ao longo do tecido urbano, enaltecer a resiliência da vida vegetal intrínseca ao corpo da cidade, que apesar de muitas vezes ignorada, marginalizada, desrespeitada, podada ou controlada, é capaz de (re)ocupar espaços através do incansável germinar de sementes e do tropismo persistente de raízes antigas. Aqui, o encontro entre a trama do tecido e a poesia bordada é entendido como análogo à ideia de coexistência. Visto que cada corpo-fio, ao enlaçar-se e reenlaçar-se revela-se indissociável da concepção do corpo-trama. Desse modo, cada corpo-trama-poesia visa, não somente, destacar e integrar o agenciamento entre a malha urbana e a vida vegetal, mas sugerir um diálogo entre o observador, a espécie vegetal e o tecido urbano que os enlaça. Neste sentido, esta intervenção propõe uma nova perspectiva baseada na coexistência entre mundos construídos e naturais, entre humanos e não-humanos. Convidando-nos ao questionamento das atuais estruturas socio-ambientais, ao contemplar a (re)ocupação da malha-urbana-uma-vez-natural por uma paisagem híbrida urbana-natural. 

Visando o menor impacto ambiental possível, para esta intervenção priorizei a utilização de fibras naturais (linho e algodão), assim como, de cola 100% natural (água, farinha e vinagre).

Ficha técnica:

Obras: 

(Co)exitir como ato de resitência,

Raízes são mais fortes que a poda,

(Re)ocupar a malha urbana uma vez natural,

Existir além da delimitação imposta.

Linho, algodão e cola natural. 

10x05cm cada (aproximadamente) 

2021

Porto.

Clique aqui para saber mais sobre os estudos do corpo têxtil e aqui para visualizar as intervenções urbanas que Mariana realizou em Portugal e no Brasil. 

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